
Canaã dos Carajás, no Pará, perderá arrecadação com a Reforma Tributária aprovada na Câmara dos Deputados (Foto: )
Brasília – É grande a expectativa
às vésperas do comparecimento dos governadores ao Senado para discutir a
proposta de reforma tributária. O debate ganha novos números com o estudo divulgado
nesta segunda-feira (28) pelo Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea),
ao indicar que 82% dos municípios e 60% dos estados devem ampliar sua
participação no bolo tributário se as mudanças já aprovadas pela Câmara dos
Deputados forem ratificadas pelos senadores. A análise calcula que o Pará
ganhará 14% de arrecadação e, especificamente, o município de Canaã dos Carajás
perderá percentual de sua atual receita.
As cidades
de menor Produto Interno Bruto (PIB) per capita ganhariam com a mudança.
Aproximadamente R$ 50 bilhões (ou 21% das receitas municipais) trocam de mãos,
beneficiando 82% das cidades brasileiras, onde vivem 67% da população.
O estado de
São Paulo e a sua capital estão entre os chamados perdedores, mas nenhum dos
dois terá perda efetiva de arrecadação devido à longa regra de transição.
O estudo
“Impactos redistributivos da reforma tributária: estimativas atualizadas”
simula quanto cada estado e cada um dos 5.568 municípios brasileiros
arrecadariam se a reforma já vigorasse em 2022. Com a redistribuição de
receitas, o grau de desigualdade cairia 21% entre os municípios, segundo o
índice de Gini (indicador que mede a concentração de renda).
Senado
O que
explica o efeito redistributivo dos estados e municípios mais ricos para os
mais pobres, segundo os pesquisadores, é a unificação do Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto sobre Serviços de
Qualquer Natureza (ISS) em um novo imposto sobre bens e serviços cuja
arrecadação pertenceria ao local de consumo e não ao local em que estão
instaladas as empresas, como hoje.
“Se o
imposto incide sobre o consumo e é pago pelos consumidores, nada mais justo e
natural que esse imposto retorne para o local em que vivem as pessoas que
pagaram por ele,” afirma Sergio Gobetti, um dos autores da análise, ao lado da
economista Priscila Monteiro.
A reunião
com os 27 governadores brasileiros foi marcada para essa terça-feira (29) pelo
presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), no plenário da Casa. A sessão
deve durar o dia todo e é aguardada com grande expectativa em razão do embate
que começou a ser travado, ainda na Câmara, entre os estados das regiões mais
ricas e pobres em torno da divisão dos recursos do Fundo Nacional de
Desenvolvimento Regional, previsto na reforma. Prefeitos das capitais e maiores
cidades também seguem insatisfeitos com o texto aprovado pelos deputados.
Segundo o
economista do Ipea, a sistemática atual de distribuição das receitas gera
extrema desigualdade entre os municípios de praticamente todas as unidades
federadas. Em Goiás, por exemplo, a diferença de receita per capita entre a cidade
mais rica (Alto Horizonte) e a mais pobre (Santo Antônio do Descoberto) chega a
127 vezes e cairia para quatro com a reforma tributária.
O
governador do estado, Ronaldo Caiado (UNIÃO), é um dos maiores críticos da
proposta. Ele reclama do fim da possibilidade de concessão de incentivos
fiscais estaduais às empresas.
Em alguns
estados, pode haver perda de receita, mas os municípios ganham mais, o que
explica o porquê do percentual de estados ganhadores (60%) ser menor do que o
dos municípios ganhadores (82%). O estudo aponta seis unidades da federação
(Amazonas, Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, São Paulo e
Rondônia) como os potenciais “perdedores”, mas apresenta simulações segundo as
quais nenhum deles (e também nenhuma capital) terão queda de arrecadação devido
à regra de transição aprovada, que durará 50 anos.
No estudo,
os dados de cada UF representam a soma das receitas dos estados e dos seus
municípios. No caso de São Paulo, a redução ocorre devido, principalmente, à
perda de participação da sua capital e de alguns municípios no total da
arrecadação. O governo de São Paulo também teria uma perda relativa de 7%.
A queda de
arrecadação é evitada, segundo os pesquisadores, porque a regra de transição
prevê que, nas primeiras décadas, a maior parte das receitas continue sendo
distribuída pelas regras atuais.
Daqui a 25
anos, por exemplo, no meio da transição, metade dos recursos continuaria
repartido como hoje e outra metade seria entregue para a localidade de consumo.
Além disso, o fundo de compensação constituído com 3% da receita do novo
imposto também reforçaria o caixa dos estados e municípios “perdedores”.
“Na maior
parte dos casos, a menor fatia do bolo de alguns entes federados será
compensada pelo crescimento do próprio bolo, mesmo em cenários mais pessimistas
de crescimento da economia,” prevê Gobetti.
Segundo as
simulações apresentadas no estudo, em um cenário mais pessimista, no qual o PIB
cresça apenas 1,5% ao ano, bem abaixo da média histórica, os estados e as capitais
com pior desempenho teriam expansão de suas receitas de pelo menos 0,9% ao ano.
No cenário
pessimista, apenas 32 cidades brasileiras correriam risco de chegar ao final da
transição com receita menor do que hoje. Entre elas, estão aquelas muito ricas
que são sedes de refinaria de petróleo ou hidrelétricas, como Paulínia (SP),
São Francisco do Conde (BA), São Gonçalo do Rio Abaixo (MG) e Alto Horizonte
(GO), todas com receitas per capita muito superiores à média nacional. Nenhuma
capital terá queda de arrecadação.
“Mas mesmo
essas cidades não sofrerão nenhuma queda brusca de arrecadação, será um
processo lento de acomodação das suas receitas à nova realidade, sem risco de
descontinuidade dos serviços públicos,“ explica o economista.
No outro
extremo, o estudo estima que cidades muito pobres da periferia das capitais
serão muito beneficiadas, como Carapicuíba (SP), São Gonçalo e São João de
Meriti (RJ), Novo Gama e Águas Lindas de Goiás (GO), Alvorada e Viamão (RS),
Ribeirão das Neves (MG), entre outras.
Distribuição das receitas
Veja quais
unidades da federação ganham e perdem no bolo total de arrecadação com a
aprovação da proposta de reforma tributária, de acordo com estudo do Ipea:
Quem ganha
- Amapá: 49%
- Distrito Federal: 48%
- Piauí: 47%
- Rio Grande de do Norte: 27%
- Alagoas: 26%
- Acre: 22%
- Paraíba: 21%
- Sergipe: 19%
- Maranhão: 18%
- Ceará: 17%
- Paraná: 16%
- Rio de Janeiro: 16%
- Pará: 14%
- Rio Grande do Sul: 14%
- Tocantins: 13%
- Bahia: 8%
- Roraima: 3%
- Goiás: 3%
- Minas Gerais: 1%
- Pernambuco: 0%
- Santa Catarina: 0%
Quem perde
- Amazônia: -34%
- Espírito Santo: -30%
- Mato Grosso: -23%
- Mato Grosso do Sul: -21%
- São Paulo: -14%
- Rondônia: -8%
Municípios em risco
Confira a
lista das 32 cidades que podem perder arrecadação no cenário mais pessimista,
segundo o estudo do Ipea..
1.
São
Francisco do Conde (BA)
2.
São Gonçalo
do Rio Abaixo (MG)
3.
Alto
Horizonte (GO)
4.
Paulínia
(SP)
5.
Guamaré
(RN)
6.
Alvorada de
Minas (MG)
7.
Barueri
(SP)
8.
Cachoeira
Dourada (MG)
9.
Itatiaiuçu
(MG)
10.
Indianópolis
(MG)
11.
Santa Rita
do Trivelato (MT)
12.
Pimenteiras
do Oeste (RO)
13.
Canaã dos Carajás (PA)
14.
Triunfo
(RS)
15.
Jeceaba
(MG)
16.
Rio Doce
(MG)
17.
Ipojuca
(PE)
18.
Perolândia
(GO)
19.
Louveira
(SP)
20.
Araporã
(MG)
21.
Sandovalina
(SP)
22.
Paraíso das
Águas (MS)
23.
Aratiba
(RS)
24.
Extrema
(MG)
25.
Madre de
Deus (BA)
26.
Tapira (MG)
27.
Selvíria
(MS)
28.
Catas Altas
(MG)
29.
Congonhas
(MG)
30.
Ouvidor
(GO)
31.
Alcinópolis
(MS)
32.
Cubatão
(SP)
Por Val-André Mutran – de Brasília