No ano de 2015, a Procuradoria Geral da República através do
representante à época Rodrigo Janot ingressou com uma ação perante o Supremo
Tribunal Federal, no qual requeria que fosse afastada a vigência do dispositivo
que constante no Código de Processo Penal[1],
que determinava que pessoas com diploma de curso superior seriam recolhidos em
uma prisão especial nos casos de prisão cautelar, ou seja, sem condenação
definitiva.
Dentre os argumentos trazidos pela Procuradoria eram de que, caso ficasse
ainda vigente a norma até então contida no Código de Processo Penal criaria
distinção entre pessoas, seria perpetuado desigualdade entre brasileiros e
violando a dignidade humana.
Na última sexta-feira, 31, o Supremo Tribunal Federal julgou o mérito
desse processo[2] e de
forma unânime declararam a não recepção dessa norma pela Constituição Federal,
portanto essa regra contida no Código de Processo Penal passará a não valer
mais, pondo fim a separação de presos provisórios com e sem diploma de curso
superior.
No caso o Ministro Relator do caso Alexandre de Moraes em uma parte que
chamou atenção usou como fundamento que: “o regime
especial de prisão para quem cursou ensino superior é um 'verdadeiro privilégio
social' incompatível com o princípio de igualdade democrática e não vê justificativa
'razoável' para a distinção dos presos provisórios por grau de instrução. A meu
ver, a previsão do direito à prisão especial a diplomados em ensino superior
não guarda nenhuma relação com qualquer objetivo constitucional, com a
satisfação de interesses públicos ou à proteção de seu beneficiário frente a
algum risco maior a que possa ser submetido em virtude especificamente do seu
grau de escolaridade. a categorização 'fortalece desigualdades, especialmente
em uma nação tão socialmente desigual como a nossa'. O último Censo do IBGE,
feito em 2010, mostra que só 11,30% dos brasileiros têm ensino superior
completo. O número cai quase pela metade entre os pretos e pardos: apenas 5,65%
conseguem se formar na universidade. Ao permitir-se um tratamento especial por
parte do Estado dispensado aos bacharéis presos cautelarmente, a legislação
beneficia justamente aqueles que já são mais favorecidos socialmente, os quais
já obtiveram um privilégio inequívoco de acesso a uma universidade”.
Nesse trecho, na minha opinião, o Ministro e
posteriormente acompanhado por todos os demais Ministros acertam em pôr fim a
esse tipo de “privilégio” para presos provisórios (sem condenação definitiva)
que detenham curso superior, primeiro porque não existe critério lógico nessa
distinção, ideia que não casa com àquilo que à Constituição Federal determina
de igualdade perante à lei. Em segundo, na precariedade do sistema
penitenciário onde em vários Estados do Brasil há falta de vagas nos presídios
era e é inviável, na prática colocar esse tipo regra para funcionar.
Por outro lado, o que deve ser observado os
critérios estabelecidos pelo Código de Processo Penal e Lei de Execução Penal,
e que, no dia-a-dia, às vezes não são observados em relação à separação de
presos provisórios (sem condenação) com os presos definitivos que já estão
cumprindo pena[3];
deve existir uma classificação por tipo de crime[4] e gênero[5] na hora de ser posto o
cidadão dentro do sistema prisional.
Por fim, a decisão do Supremo Tribunal Federal impondo
fim a um regime especial de prisão para o preso provisório que detenha diploma
de ensino superior é acertada e, nesse ponto, acaba como a seletividade penal,
afinal educação não pode ser vista como um privilégio e sim como um direito. É
isso.
Cássio Carneiro Duarte. Advogado, pós-graduado em
direito penal e processo penal pela Escola Superior de Direito — ESD;
pós-graduado em direito penal econômico pelo Instituto Brasileiro de Ciências
Criminais — IBCCRIM, em parceria com a Universidade Coimbra — PT; membro da
Associação Brasileira de Advogados Criminalistas — ABRACRIM, voluntário do
Instituto Pró-bono. E-mail: contato@carneiroduarte.com.br
[1]
Art. 295. Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial,
à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de
condenação definitiva:
VII - os diplomados por qualquer
das faculdades superiores da República;
[3]
Lei de Execução Penal n° 7.210/84. Art. 84. O preso provisório ficará separado do
condenado por sentença transitada em julgado.
[4]
Lei de Execução Penal n° 7.210/84. Art. 5º Os condenados serão classificados,
segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização
da execução penal.
Art. 8º O condenado ao cumprimento de pena
privativa de liberdade, em regime fechado, será submetido a exame criminológico
para a obtenção dos elementos necessários a uma adequada classificação e com
vistas à individualização da execução.
[5]
Lei de Execução Penal n° 7.210/84. Art. 82. Os estabelecimentos penais destinam-se
ao condenado, ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao
egresso. § 1° A mulher e o maior de sessenta anos, separadamente, serão
recolhidos a estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal.
